Preconceito e estigma marcam luto por suicídio

Data01/11/2016 CategoriaCVV

A vida costuma ser comparada a um imenso quebra-cabeças. Quando a morte chega e o luto toma a gente de assalto, a dor da ausência parece atingir a alma. É visceral. Esse processo é vivido de forma singular de ser para ser. Segundo os estudiosos, as circunstâncias da morte impactam diretamente no processo de luto. As repentinas e inesperadas, violentas, são consideradas fatores de risco para a saúde mental. Neste campo, está o suicídio. O psicólogo Carlos Henrique Aragão Neto explica que é uma das mortes mais difíceis de ser enfrentada em qualquer família. Além de todo o sofrimento, ainda há julgamento social, preconceito e estigma. “São consideradas famílias desajustadas, desequilibradas e desestruturadas”, destaca ele, sobre os sentimentos comuns na cultura ocidental.

Ele observa que esse luto muitas vezes não é reconhecido socialmente. É um momento sofrido. Os mais próximos da pessoa que cometeu o suicídio são chamados sobreviventes pois, como observa o psicólogo Marcelo Tavares, professor da Universidade de Brasília, sobreviveram ao suicídio. Sobreviveram ao choque e à sensação de anestesia. Vivenciam um importante capítulo da história que inclui decisões urgentes, perícia, inquérito policial, lidar com a cena do suicídio e com detalhes, como cartas, deixadas por alguém muito querido. Mas, não raro, sequer têm coragem de comentar as circunstâncias trágicas da morte, seja por vergonha ou por culpa, como se tivessem poderes para mudar o que agora é a realidade.

No livro O Suicídio e os Desafios para a Psicologia, Tavares observa que as reações que se têm ao risco de suicídio ou ao suicídio provocam emoções muito poderosas. “Medo, culpa, raiva, tristeza, ansiedade, vergonha, saudade”. A essas, somam-se efeitos da negação, depressão, isolamento, não aceitação, problemas de ajustamento, dificuldades de estabelecer novas relações, sensação de desamparo e desenvolvimento de transtornos mentais. Na mesma obra, a também psicóloga Lúcia Cecília da Silva explica que esse processo atinge até mesmo a rede social do enlutado. “As pessoas também se sentem constrangidas em relação a esse modo de morte, não sabem o que dizer ao enlutado, como ajudar; não sabem se devem evitar tocar no assunto ou não”.

E por isso é comum o suicídio se transformar em segredo de família. Um tabu. Algo a não ser comentado, pois há grande diferença entre a morte ser assimilada pelo intelecto e aceita no aspecto emocional pelo indivíduo. Racionalmente sabe-se que o outro morreu, observa Aragão Neto, mas a aceitação não acontece. E a única forma de lidar com essa situação é falar e falar. E, do lado de cá, quem escuta, precisa manter uma atitude extremamente acolhedora. “Uma atitude para que todos esses enlutados – seja a família, seja outro tipo de grupo (como escolares), seja um indivíduo – possam falar, possam compartilhar os seus sentimentos e possam se sentir seguros de que não serão julgados”, conclui Tavares.

Leila
CVV – Brasília (DF)

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